quinta-feira, 14 de agosto de 2014

"(...) O problema do Brasil é que ao contrário do que ocorreu na maioria dos países, especialmente alguns como China e Índia, nosso índice de produto por trabalhador ficou estacionado nos últimos 30 anos em comparação com os Estados Unidos: "estamos crescendo menos que a fronteira, não estamos absorvendo as revoluções técnicas do resto do mundo." (...)"

João Pedro Caleiro, na Exame.com

Discurso fatalista condena nosso crescimento, diz Scheinkman

Em palestra no EXAME Fórum, professor da Columbia University destacou produtividade estacionada e condenou discurso "de desculpas" pelos resultados atuais

Lela Beltrão/EXAME.com
José Alexandre Scheinkman em palestra no EXAME Fórum                  
José Alexandre Scheinkman, professor da Columbia University, em palestra no EXAME Fórum

São Paulo - A produtividade dominou a palestra de José Alexandre Scheinkman no EXAME Fórum, realizado nesta quarta-feira no hotel Unique em São Paulo.

Carioca de 66 anos, Scheinkman é autor de mais de 80 artigos acadêmicos – inclusive em parceria com prêmios Nobel e pesos-pesados como Ben Bernanke, ex-presidente do Fed.

Depois de 26 anos na chefia do departamento de Economia da Universidade de Chicago, um dos mais prestigiados do mundo, ele passou 13 anos na Universidade de Princeton e se tornou no ano passado professor emérito na Columbia University.

Acompanhado de gráficos e com o tema "Os limites do crescimento econômico brasileiro e como ampliá-los", Scheinkman começou a palestra com uma citação de Paul Krugman: “produtividade não é tudo, mas no longo prazo é quase tudo."

O problema do Brasil é que ao contrário do que ocorreu na maioria dos países, especialmente alguns como China e Índia, nosso índice de produto por trabalhador ficou estacionado nos últimos 30 anos em comparação com os Estados Unidos: "estamos crescendo menos que a fronteira, não estamos absorvendo as revoluções técnicas do resto do mundo."

Ele se incomoda com a visão fatalista com este cenário: "é um absurdo total pensar que somos um país complexo e que por isso não podemos crescer mais de 2% ao ano como acontece na fronteira. Esse discurso de "desculpas" condena o pais a produzir um quinto ou um quarto do produto por trabalhador dos países mais ricos."

Para entender nossa defasagem na produtividade, Scheinkman diz que não dá para olhar o país como uma coisa só, e coloca um foco microeconômico e na diferença entre os setores:

"A produtividade do trabalho na intermediação financeira cresceu mais de 4% ao ano entre 2000 e 2009. Na indústria de transformação e construção civil, piorou mais de 1% ao ano. A da agricultura cresceu 60% mais por aqui que nos EUA desde os anos 90 – taxas chinesas."

Por que a agricultura? Ele cita como fatores a desregulamentação do mercado nos anos 1990, concorrência e integração com a economia global, ganhos de escala e a Embrapa, um caso raro de sucesso dentro do nosso atrasado (mas essencial) campo da pesquisa e desenvolvimento.

No começo dos anos 2000, Brasil, China e Índia tinham praticamente o mesmo numero de patentes registradas por ano. Hoje, a China está acima de 6 mil e o Brasil continua no mesmo patamar.

Ele cita o caso de dois países pequenos, Israel e Finlândia, que registram mais patentes do que nós. A razão: começaram a investir em pesquisa e desenvolvimento quando tinham renda per capita ainda menor que a nossa.

André Lahóz, diretor de redação da revista EXAME, começou a sessão de perguntas pedindo para que Scheinkman escolhesse duas prioridades para o próximo governo. A resposta: reforma tributária e infraestrutura, temas já destacados na sua fala.

"Temos um dos piores impostos de valor adicionado do mundo – talvez o pior, na disputa com o Haiti. O que nos precisamos realmente é de simplificação – o Simples tornou o pequeno produtor um pouco mais formal, mas não dá o menos incentivo para ele crescer, porque daí ele sai do Simples. Precisamos de simplificação pra todo mundo."

Questionado sobre possíveis conflitos entre tamanho e qualidade de crescimento, além da relação entre desenvolvimento econômico e social, Scheinkman disse que eles acontecem, mas no geral os fenômenos são complementares:

"Não há nenhum choque entre você crescer e ao mesmo tempo crescer melhor. O bolsa família é um exemplo de programa que trouxe melhorias sem custo muito alto e todos os estudos mostram que um pais com distribuição de renda melhor tende a crescer melhor. Mas o crescimento por si só também traz melhorias – o trabalhador ganha mais, e assim ele melhora seu nível de vida."